AXÉ !!!

"Energia mágica, universal sagrada do orixá. Energia muito forte, mas que por si só é neutra. Manipulada e dirigida pelo homem através dos orixás e seus elementos símbolos... o conteúdo mais importante do "TERREIRO DO CANDOMBLÉ" é o AXÉ. É a força que assegura a existência dinâmica, que permite o acontecer e o de vir. Sem axé a existência estaria paralisada, desprovida de toda a possibilidade de realização. É o princípio que torna possível o processo vital."



domingo, 21 de outubro de 2012

Candomblé - Origem (resumo de uma abordagem)




Candomblé - Origem

O candomblé, como conhecemos no Brasil, é um sub-produto dos "Cultos aos Males, Irunmales e Orixás". Estes cultos são originários do Continente africano. Foram espalhados pelo mundo no advento da escravidão dos negros africanos. Vários povos (ou nações) foram trazidos para o Brasil como escravos. Cada nação era formada por várias tribos. Cada tribo tinha sua forma de culto e seu deus particular. Ex. (Povo Nagô) 

Cidade: Oyó = Deus adorado: Xango
Cidade: Irê = Deus adorado: Ogum
Cidade: Keto = Deus adorado: Oxossi
Cidade: Ilexá = Deus adorado: Oxum
Cidade: Ibadam= Deus adorado: Yemanjá

Cada indivíduo por sua vez adorava o deus coletivo, seu bara (dono do seu corpo), seu olori (dono de sua cabeça) e seu odu (seu destino).

Há outros cultos menores e particulares: 

Geledé: Culto a Yami Oxorongá (minha mãe feiticeira) culto de exclusividade feminina onde algumas mulheres eram consideradas como tendo poderes sobrenaturais. Seu domínio e seu símbolo eram as aves. 

Egungun: Culto prestado aos mortos, feito somente por homens. Eles acreditam ter domínio sobre as almas errantes. Porém há grande temor entre eles. Acreditam que, quando a alma desencarnada está manifesta, não se pode tocar nem em suas roupas que são coloridas e tem armações de bambu. Os mortos não incorporam, manifestam-se de forma sobrenatural entrando numa dessas roupas. 

Formação do panteão de orixás: 

Com a vinda de muitas nações africanas para o Brasil, vieram um sem número de cultos e deuses. No nordeste do Brasil a predominância, entre outros povos trazidos, foi dos Nagôs que falavam o Yorubá (língua do rei). Já no sudeste a predominância foi dos povos bantos. Com a necessidade deles viverem juntos nas senzalas (tanto no nordeste como no sudeste do Brasil) ouve uma mesclagem das culturas (roupas, dialetos, indumentárias cultos e etc.) com as predominâncias já citadas. Daí nasce o que chamamos no Brasil Candomblé. Palavra de origem desconhecida. 

Obs. Neste ensaio faremos referência a esses dois povos. 

Conceito de Deus: 

Para os nagôs (nordeste do Brasil) existe um criador de todas as coisas, cujo nome não é permitido dizer. Eledumarê ou Eledumayê ou ainda Olodumaré, (Senhor do Destino Eterno ou Deus Eterno). Vale comparar com o título dado a Deus: El adonai. 

Para os bantos (sudeste do Brasil) o criador é Zambi . 

Conceito de Salvação: 

Na visão dos nagôs, quando um africano morre crê-se que ele vai para um dos nove oruns (céus) existentes. Quem cuida desses oruns é uma entidade chamada Oyá - Inhaçã (Yámesan - Mãe dos nove - fazendo referência aos nove oruns ou nove cabeças). 

Quando uma alma desencarnada fica vagando, é chamado o alagbá (chefe do culto dos egunguns) para despachá-lo. 

Há também uma cerimônia quando alguém ligado ao culto morre. É o Axexê - cerimônia fúnebre para apascentar o morto e invocar Oyá Balé (título que significa: senhora dos mortos ou do cemitério) para levá-lo ao seu destino. 

Pecado:

Não há conceito de pecado. Todas as oferendas são feitas para agradar e reverenciar os deuses. Há dois tipos básicos de oferendas: O ebó - sacrifício ou obrigação e o Irubó - oferenda. 

Nestes sacrifícios ou oferendas acredita-se que: A energia vital do animal (seu sangue) sacrificado é transferida para o ofertante ou aquele que faz o sacrifício. 

Cerimônias de Iniciação: 

Nas cerimônias de iniciação (vide cap. Gen. 29:1-35), há um ritual chamado afejewé (nós lavamos com sangue) que é o ápice do ritual. Consiste em sacrificar vários animais e banhar o yaô (noiva - novato) naquele sangue colhido. Todos os iniciados são sacerdotes. A cerimônia visa o renascimento do yaô. O mesmo fica recluso um período de tempo que varia de tribo para tribo. Este período de reclusão eqüivale a sua morte. A cerimônia do afejewé o princípio do seu renascimento. Quando renascido o yaô recebe o seu orukó - novo nome e passa por um ritual de reaprendizagem das atividades comuns do tipo: comer, se vestir, andar sentar etc. Tudo lhe é ensinado novamente e quem faz isto é a yákota - mãe criadora ou mãe pequena. Nunca mais se pode fazer referência ao "velho homem morto" ou seja nem seu velho nome pode ser dito. Se por ventura alguém chama um desses sacerdotes por seu velho nome é como se lhe desejasse a morte. 

O candomblé no Brasil:

No Brasil muito de tudo isto se perdeu e muito foi acrescentado. O candomblecista comum acredita em Deus e os noviços são marcados no seu corpo com uma cruz, na maioria das casas de candomblés. São levados, após as cerimônias de iniciação a uma missa para receber a bênção do padre. Uma tradição que virou ritual.


Pai Paulo D'Èsù - Centro Cultural e Templo dos Orisá Egbe Ifá Ire

Feitura de iniciação ao sacerdócio no Candomblé.




O ritual de feitura de iniciação ao sacerdócio no Candomblé recebe vários nomes; fazer o santo, fazer a cabeça, deitar para o santo, oba baxé ori ou simplesmente oro, que é sacrifício e consagração. A pessoa que se inicia no Candomblé torna – se adoxu, ou seja, passa a possui oxu, que é o canal de comunicação entre o iniciado e o seu orixá. Todo iniciado no Candomblé, toda pessoa “feita no santo” doneófito ao sacerdote é adoxu.
            Feitura representa um renascimento; é o reconhecimento e a admissão do ori escolhido no orum. É o mesmo que entregar a cabeça (principio da individualidade) ao orixá (o deus maior de cada ser), permitindo que os deuses conduzam sua vida e seu destino. A feitura é um divisor de águas na vida será novo, inclusive o seu nome, pois todo iniciado recebe um ORUKÓ, ou seja, um nome dado por seu orixá e com o qual passa a ser chamado na comunidade de Candomblé.


            A feitura de santo implica um período de reclusão geralmente de 21 dias. Nesse prazo serão realizados os ebós, as oferendas a Exu e aos ancestrais, o bori, todo aprendizado em relação a religião: as rezas, os cânticos, as danças etc., e por fim o oro, ritual no qual, na maioria das vezes, o filho-de-santo tem seus cabelos raspados e recebe oxu, o kelé, os Ikan, Mokan, os Delogum, o xaorô, o Ikodidé e passa pelo ritual de efun (no qual seu corpo é marcado por pintas de giz), que se repetirá pelos sete dias subsequentes  O orixá do noviço é assentado e recebe o sacrifício de animais. O noviço, chamado de iaô (que é uma redução do nome iawórisà), é apresentado à comunidade sete dias de odoxu.
            A festa em que iaô é apresentado à comunidade é popularmente conhecida como saída de iaô e reconstitui em suas três etapas fases da concepção e do nascimento. Sempre acompanhado de autoridade como Ia quequerê e a Ajibioná (a que conduz ao caminho do nascimento), o iaô vem receber as devidas homenagens. A esteira (enin) é estendida na porta principal do barracão para que o iaô faça sua reverência (adobá): primeiro saúda o mundo, no qual viverá os dias vindouros tendo como mentos o seu orixá; voltando – se para o centro do barracão, reverencia o Ari-axé, que simboliza a comunidade, a qual apoiará em todos os seus passos, a sua grande família; finalmente, prosta –se em frente aos atabaques, saudando as autoridades, todos os ijoyé do terreiro, com os quais muito aprenderá ao longo de seus sete anos de iniciação. A cada reverência o iaô “bate pão”, ou seja, palmas compassadas. Neste ritual é acompanhada por toda a comunidade, prova de que, a partir daquele momento jamais estará sozinho.
            O momento mais esperado de saída de iaô, quando o orixá anuncia o nome da iniciação de seu filho. É a partir desse momento que começa a contar a vida co neófito na religião. É um momento de muita alegria, no qual a comunidade recebe um novo membro. É escolhido um integrante da comunidade ou um visitante ilustre para ser padrinho do iaô (babá-orumkó) e este pergunta:

-         Orúku ti Íyòwó? (QUAL O SEU NOME IAÔ?)

Ele terá a grande honra de ser o primeiro a saber do novo filho-de-santo e depois pedir ao orixá que anuncie a todos. Então, girando em torno de si o orixá fala:
-         Ode Kojá!!! (O CAÇADOR DESTEMIDO).

O babalorixa proclama:
-         Ode Kojá, kú ilé! (Ode cojá seja bem vindo a essa casa).
A comunidade em torno do mais novo membro comemora feliz:

            Wá iná, iná
        Ki mi pa Odó
        Odé Kojá, kú ilé

VENHA LUZ LUZ
QUE LOUVAMOS
TRAGAM O PILÃO
(símbolo da comunidade)
ODE KOJÁ, SEJA BEM VINDO
A ESTA CASA


            Vale dizer que transe não é imprescindível para que uma pessoa seja iniciada como odoxu, pois, independentemente  de se manifestar o orixá está em cada um de seu filho. Isso é muito importante, porque só os odoxu podem assumir determinadas funções sacerdotais, como os cargos de ialorixá ou babalorixa. Sendo assim, uma pessoa que tem em seu odu a missão sacerdotal, incorporando ou não o orixá, deve se iniciada como adoxu e nunca como ogã ou iquédi, que já são ijoyé natos e jamais poderão entrar em transe de orixá.

            Como foi dito anteriormente, algumas pessoas não precisam ser raspadas ao se iniciarem. Esse é o caso principalmente das crianças que nasceram fadadas à morte, mas venceram o trágico destino (abiku). Existe uma graduação delas que considera as especificidades de seu nascimento. Por exemplo: as crianças que nasceram com pelos no pés, com o cordão umbilical em volta do pescoço, depois de vários abortos, que foram abandonados ao nascer ou cujo as mães morreram ao dar a luz – neste último caso, se abiku for indevidamente raspado pode levar o seu pai – de – santo ( ou seja, aquele que lhe deu a vida na religião) à morte. É evidente que todo natimorto é abiku.

            Ao contrário do que se pode supor, a iniciação não se resume aos 21 dias de reclusão. Na verdade ela dura sete anos e neste período o iaô aprenderá muitas coisas e reforçará os seus votos nas obrigações de um ano e de três anos. A primeira comemora, “quando a criança começa a andar”: a segunda está relacionada ao cumprimento da metade do ciclo de iniciação. Findos sete anos, após realizar suas obrigações, o iaô passa à categoria de ebômi (egbomin), me está pronto para assumir funções sacerdotais dentro da comunidade ou formar seu próprio terreiro, tornando – se um babalórixa.
Postada no Grupo de Estudos Boiadeiro Rei

IMPORTANTE: Respeito não inclui necessariamente humilhação.




 Se você é Iawo ou iniciado de qualquer outro grau dentro da hierarquia existente no Candomblé, lembre-se que o conhecimento dos mais graduados nem sempre constitui sabedoria. Portanto, estes não podem utilizar o que sabem para diminui-lo como pessoa.

         O simples conhecer pode ser uma arma contra aqueles que que têm pleno domínio do conhecimento. sempre que possível faça lembrar os mais velhos do culto que Iawo também é responsável pela continuidade da tradição religiosa.

         E isso só pode ser realidade quando o iniciado não somente sabe como se faz um ritual, mais também qual a sua finalidade e a que se referem seus atos; Não se conforme jamais com respostas, tais como "Segredo reservado aos mais velhos".

         Se um Babalorisá age desta forma, ou ele não sabe o que esta fazendo, ou então pensa que cabeça é "lixo". Por acaso, pensa ele que a força dos orisás vai eterniza-lo sobre a terra??? é que por isso não tem necessidade de transmitir o conhecimento para aqueles que o acompanham??? De qualquer forma, este é um tipo de pessoa que não serve para ser seu "Alaasé". Iawo, se cuide!!! Se goste!!! Se respeite!!! "QUEM SABE, MORRE IGUAL AQUELE QUE NÃO SABE", e pelo avesso todos somos iguais.

         Respeito não inclui necessariamente humilhação. Reconheça sempre o seu lugar e posicione-se da melhor maneira possível. Seja digno do orisá ao qual pertence. deixe seu Ori brilhar de tal forma que a luz refletida seja como um espelho, onde muitos possam se mirar na fidelidade de sua personalidade. O Candomblé, hoje, é sem duvida uma religião com muita frequência e pouca permanência, e isso se devem a existência de "sacerdotes" inescrupulosos. , do tipo que RASPA, PINTA, CATULA, ADOXA, E ASSENTA SEM SABER O QUÊ.

         Não me casarei de dizer que a cabeça dos outros não é laboratório onde se faz pesquisa para saber sé deu certo ou não. Caso de errado procurar um jeito de acrescentar alguma coisa para ver se acerta. INICIAR ALGUÊM NO ORISÁ, é despertar o adormecido no mais profundo do inconsciente humano, o que, com certeza, o Iawo, ou até pessoas com títulos de Egbomi, Ogan Etc., saem de suas casa de origem em busca de um outro pai de santo que o adote. Este por sua vez, sedento por um "asezinho" (Dinheiro), e motivado pelo orgulho de ter sob seu asé um filho de outro Babalorisá, tenta corrigir ERROS. Tanto uns como outros, indulgentes, apressados e súbitos " a mente humana!!! Isto é apenas um exemplo do que eu vejo e acontece em decorrência do sacerdócio apressado.

         Por isso antes de fazer santo escolhe, e muito bem seu Alaasé. Muitos dizem que o Orisá é quem escolhe o Babalorisá. Puro engano, porque o livre arbítrio é, nada mais, nada menos, que o poder absoluto de decisão.

         E o futuro do homem depende dele decidir o que ele quer hoje, agora. Cuide de seu presente e preserve o seu futuro, em bom estado de equilíbrio. É preferível não ter santo FEITO, do que fazer santo MAL FEITO. E isso pode ser observado, analizado sem muita dificuldade, na Própria estrutura sócio-econômica e cultural de boa parte dos adeptos do culto que se julgam com um grande poder, porem desprovido da base estrutural do conhecimento ritual, através da qual é possível atingir a essência, a espiritualidade, ligar o homem aos orisás e estes a fonte da vida, tornando-o um veiculo de comunicação social, facilitando muito os seus passos sobre a terra.

         Havendo comunicação entre os homens, haverá comunicação entre os orisá, e conseqüentemente com OLODUMARE, que é a fonte de todas as fonte de vida, o consciente e o inconsciente do ser. Aquele que lhe conhecem a origem, hierarquia, gosto e costumes, invocações e ritos, conseguem com facilidade atingir a essência do orisá. Isto é resultado da concepção limpa. Do saber fazer, sabendo porquê, o que também é resultante da firmeza do Ori Inu " que já despertou a consciência do EU.

         Na minha opnião é assim que se cultuam os orisás acreditando na cabeça e na direção dada à ritualidade. O conceito que os Ioruba têm a respeito dos orisá é que todos nos viemos ao mundo para aproveitar devidamente o nosso tempo. E as pessoas que estão envolvidas no culto, no decurso deste tempo, devem aproveita-lo no aprimoramento das coisas relativas ao estudo e compreensão da ritualidade, de modo a aprender TUDO sobre os orisá, alcançando o respeito, em decorrência do bom senso e de força no desenvolvimento dos rituais em que atua.

         É sabido por todos que a melhor maneira de aprender a executar os atos litúrgicos é, sem duvida, em sua casa de santo de origem, onde casa iniciado pode participar, questionar seu Alaasé e obter respostas amplas em relação ao que ocorre em dado momento. Assim, vai-se aprendendo, enquanto esclarecem "se as dúvidas.

         Este é um ambiente adeguado a um apredizado seguro, onde a pratica da magia pode provar sua eficácia, em termos de resultados finais. O iniciado pode certificar-se, dia após dia, da potencialidade do culto.
  
Pai Paulo D"Èsù - Ifa Irete Kobale

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

O verdadeiro significado de ser ÀBÍKÚ.


ABIKÚ - a palavra já diz tudo:
A= Nós; Bi= Nascer; Ku= Morrer
[Nós nascemos para morrer]

No Orun, um mundo paralelo que nos rodeia, onde vivem Deuses e Antepassados, palavra facilmente traduzível por Céu, mora um grupo de crianças chamado Egbe Orun Abiku: as crianças que nascem para morrer em curto espaço de tempo, gerando grande sofrimento para as suas famílias. As meninas são chefiadas por Oloiko [chefe de grupo] e os meninos, por Ìyájanjasa [a mãe que bate e corre].

A permanência dos Abiku ou Emere é condicionada a um pacto que fazem na vinda do Orun para o Aiye [a Terra] com Onibode Orun, o porteiro do Céu.

Este pacto é cumprido rigorosamente pelos Abiku, e uma criança cujo o acordo for não nascer, realmente não nascerá; outra que combine voltar quando romper seu primeiro dente, terá morte súbita, por acidente ou por doença, horas ou dias após o aparecimento deste dente.

Quando uma criança Abiku nasce, seu par, aquele seu companheiro mais chegado no Orun, começará a interferir em sua vida, atormentando-a, aparecendo-lhe em sonhos, a fim de que não se esqueça de seus amigos do Orun e rapidamente volte para eles, assim que houver cumprido o seu pacto.

Várias histórias de Abiku nos são relatadas nos Itan Ifá, pelos odú Odi, Obara, Ejiogbe, Irete-Irosun, Otura-Rete, Iwori-Wosa entre outros (Tradição oral).

IWORI-WOSA
O dia que uma criança dá o aviso que vai se suicidar
Não se pode permitir que sua intenção se concretize
Ifá foi consultado para Matanmi (não me engane)
Que estava vindo do Céu para a Terra
Ele foi avisado que deveria fazer sacrifício
O que devemos sacrificar para não sermos enganados pela Morte?
Carneiro
O que devemos sacrificar para não sermos enganados pela Doença?
Carneiro

EJIOGBE
O olho da agulha não goteja pus
No banheiro não se põe uma canoa a navegar
Ifá foi consultado para Òrúnmìlà
Quando ele fazia um pacto com Emere (Àbíkú)
Um pacto fora feito com Emere (Àbíkú)
Ele não iria morrer logo na flor da idade
O caso do Emere (Àbíkú) agora fica seguro com Ifá
A primeira vez que os Àbíkú vieram para a Terra foi em Awaiye, rei de Awaiye, num grupo de duzentos e oitenta, trazidos por Alawaiye, rei de Awaiye e chefe deles no Òrun. Na vinda para a Terra, todos pararam no portal do Céu e vários pactos foram feitos. Eles voltariam ao Òrun quando:
- Vissem pela primeira vez o rosto de sua mãe;
- Casassem;
- Completassem 7 dias de vida;
- Tivessem novo irmão;
- Construíssem uma casa;
- Começassem a andar.

E nenhum queria aceitar o amor de seus pais, e os presentes e mimos seriam insuficientes para retê-los na Terra, e talvez alguns absolutamente não nascessem.

Esta primeira leva de crianças Àbíkú combinaram entre si também roupas, rituais, chapéus e turbantes, tingidos de òsun que teriam valor simbólico de 1.400 búzios e que, se seus pais adivinhassem estas roupas e dessem-nas como oferendas, poderiam segurá-las na Terra.

As roupas seriam colocadas penduradas nas árvores do Bosque Sagrado dos Àbíkú, em Awaiye, e seus pais fariam anualmente uma festa, com tambores e cantigas, para alegrar os Àbíkú, que seriam untados com òsun, e não voltariam mais ao Òrun, rompendo assim o pacto feito, e seu vínculo com o Egbe Òrun Àbíkú.

Outras histórias são contadas por Òrúnmìlà sobre crianças que, depois de várias idas e vindas entre o Céu e a Terra, puderam ser conservadas vivas, devido a seus pais terem consultado Ifá e feito os Ebós determinados por Òrúnmìlà, trocando ou acrescentando um nome que os desanimasse de morrer novamente, usando folhas sagradas em fricções nos seus corpinhos, para afastar os outros companheiros Àbíkú, colocando em seus tornozelos Sawooro , fazendo em seus corpos pequenas incisões, e através delas inserindo pó preto e mágico de uma mistura de folhas, e com este mesmo pó enchendo um amuleto de couro em forma de pequeno saco, chamado Óndè que seria preso à cintura da criança.

Alguns Àbíkú também deveriam colocar em seus tornozelos pesadas argolas e correntes que não os deixariam fugir para o Òrun. As oferendas eram feitas como recomendavam os Itan Ifá - troncos de bananeira, cabras, galos, pombos, roupas e chapéus tingidos com òsun, alimentos, guizos, búzios, doces, bebidas, a serem entregues no Bosque Sagrado, ou enterrados à margem de um rio, ou soltas nas águas.

Estes Ebós possibilitariam aos pais reter seus filhos na Terra, e eles não morreriam mais.
Porém, se apesar das oferendas, os chefes das Comunidades Àbíkú, Oloiko e Iyajanjasa insistissem em vir à Terra em busca de suas crianças, e conseguissem levá-las de volta ao Òrun, os pais deveriam marcar seus corpos com cortes, ou mesmo mutilá-los ou queimá-los, para que seus pares no Òrun não os reconhecessem ou aceitassem de volta. Também pelas marcas seriam reconhecidas quando voltassem à Terra e não quereriam mais nascer.

Nas terras de ancestralidade Yorùbá, uma mãe que perde vários filhos antes ou depois do nascimento, por morte brusca, súbita ou inexplicável, procura um Bàbáláwo e descobre estar dando à luz a uma criança Àbíkú, que pode nascer e morrer inúmeras vezes impedindo-a também de ter filhos normais.

O Bàbáláwo indica a necessidade de Ebó, o uso de folhas, procedimentos estes usados para afastar o Àbíkú, se os filhos da mulher estiverem mortos, e para que ela possa gerar crianças perfeitas. Ou para reter a criança na Terra e romper seu vínculo com o Òrun, mantendo-a viva.
Até que a criança complete nove anos, sempre próximo à data do seu aniversário, determinadas oferendas serão feitas e depois repetidas até o Àbíkú completar dezenove anos.

A criança deverá usar roupas especiais, com enfeites e cores específicas, seu nome deve ser mudado ou a ele acrescentado outro, que desestimule sua volta ao Òrun.

Guizos em quantidade devem ser presos a seus brinquedos, roupas, tornozelos, pulso, pois o som dos guizos faz bem ao Àbíkú e afasta os amigos do Céu.

A fava Éerù, no Brasil chamada Bejerekun, deve ser usada em banhos e chás, pacificando a criança, Efun também pode ser utilizado para acalmá-la.

As folhas são usadas em fricções ou banhos, e com elas é feita a mistura mágica com a qual se protege a criança e se prepara o amuleto, que o Àbíkú carregará por toda a sua vida.
O corpo da mãe também deve ser defendido e esfregado com folhas, para que ela não atraia uma nova criança Àbíkú.

Se a mãe tiver também problemas com Egbe, chamada Eleeriko, uma deusa considerada o feminino de Egungun, que atormenta as crianças, marcando-lhes o corpo durante a noite, ela será avisada de que deve zelar por Egbe, entregando-lhe cabaças com oferendas no rio, e louvando-a a cada quinto dia. Também um altar com símbolos religiosos poderá ser instalado na casa, e anualmente serão feitas festas com sacrifícios de animais, tambores e dança.

Nem toda criança Àbíkú é atormentada por Egbe que também pode dar filhos às mães que a louvam.

Há alguns Orìkí de Egbe que demonstram bem esta ligação. Este que damos a seguir é de Ibadan, e é uma súplica para que Egbe envie crianças sadias que não sejam Àbíkú ou Emere.

Mãe, proteja-me, eu irei ao rio
Não permita Emere seguir-me em casa
Mãe proteja-me, eu irei ao rio
Não permita que uma criança amaldiçoada siga-me em casa
Mãe proteja-me, eu irei ao rio
Não permita que uma criança estúpida siga-me em casa
Olugbon morrei e deixou filhos atrás dele
Arega morreu e deixou filhos atrás dele
Olukoyi morreu e deixou filhos atrás dele
Eu não poderei morrer sem deixar filhos atrás de mim
Eu não poderei morrer de mãos vazias, sem descendentes.



O verdadeiro significado de ser ÀBÍKÚ - continuação


No Brasil, porém, o termo Àbíkú, dito "Abikum" tem significado totalmente diverso. A mãe que entra grávida para o processo de iniciação, dá a luz à uma criança que já nasce "feita pronta", sem necessidade da tonsura ritual. Quando esta criança completa sete anos, sacrifícios são feitos para seu Òrìsà, sua cabeça é recoberta por uma cabaça antes que o sangue seja derramado, pois sobre a cabeça de uma criança "Abikum" o sangue não deve correr.

Esta criança nunca estará sujeita a um transe de possessão por um Òrìsà, a ela estarão vetadas a maioria dos cargos dentro da hierarquia sacerdotal brasileira. Ao mesmo tempo, ela já nasce com um posto honorífico, o de "feita sem ter sido raspada", e é tido com certo que nenhum mal físico ou espiritual poderá atingi-la.

Dizem também alguns sacerdotes que as crianças que nascem em datas determinadas são "Abikum". E, sendo assim, pais e mães ambiciosos, programam seus filhos para que nasçam nestes dias, e até mesmo operações cesarianas são realizadas, para adequar a chegada ao mundo das crianças às datas de nascimento apropriadas para "Abikum".

O modo de encarar a pessoa "Abikum" muda de casa para casa, podendo ser acrescentados ou eliminados detalhes dessa explanação.

Os pais e mães de Òrìsà brasileiros deveriam reavaliar seu conceito sobre crianças Àbíkú, uma vez que estes nascimentos ocorrem não só na terra Yorùbá, elas nascem em todo o mundo e no Brasil também. É imperioso também que se instruam sobre todo o ritual sacro a ser realizado dentro da problemática Àbíkú.

Vários povos ao redor do Golfo de Guinéa tem a mesma crença nos Àbíkú, embora dêem à eles nomes diferentes. Os Nupe chamam-nos de Kuchi ou Gaya-Kpeama. Entre os Ibo, são chamados Ogbanje ou Eze-Nwanyi ou Agwu ou ainda Iyi-Uwa Ogbanje. Já os Haussa chamam-nos Danwabi ou kyauta. Os Akan denominam a mãe de um Àbíkú Awomawu e entre os Fanti são conhecidos por Kossamah.

Famílias que já perderam um ou mais filhos, tendem a buscar na religião um consolo e uma explicação para estas mortes, e é dever da Tradição de Òrìsà e do Candomblé Ketu, estar apta para oferecer, além de um amparo religioso que diminua o sofrimento dos pais, uma solução para que tal tragédia não mais ocorra.

Temos muita pouca literatura em português sobre o assunto, talvez apenas a tradução de um excelente artigo de Pierre Verger, publicado em 1983 na Revistas Afro-Asia no 14, com uma explanação ampla sobre Itan Ifá, Oruko Àbíkú, folhas e Ofo do qual farei citações literais mais adiante.

Outros autores africanos, franceses e ingleses falam sobre o assunto, em considerações superficiais ou profundas, mas suas publicações não estão disponíveis para a quase totalidade do sacerdócio brasileiro.

O fato de não possuirmos no Brasil local determinado, como a Floresta Àbíkú de Awaiye, não nos impede de sacralizar parte de um bosque para receber as oferendas das famílias das crianças Àbíkú.

Tomando por base as recomendações do Itan Ifá, um Ebó poderá ser montado com um pedaço de tronco de bananeira, roupas e gorros tingidos de òsun e bordados de guizos e búzios, pratos com comidas [Iyan; Akara; Ekuru; Eko; Doces; Canjica; Frutas; Mel; Guizos; Bebidas; Animais; Cabra; Pombo; Galo; Folhas].

As roupas serão colocadas nos galhos da árvores, as comidas e oferendas ao redor no chão, ou monta-se um carrego como para a morte, embrulhado em pano branco, que será enterrado ou solto nas águas de um rio.

Não é necessário o uso de palavras, pois só o fato dos pais saberem qual o significado da oferenda secreta é suficiente para dar força mágica ao Ebó.

Nada porém deve ser feito sem confirmação e autorização de Òrúnmìlà, pois só a ele cabe nos orientar em nossas dificuldades e dúvidas.

As folhas são colhidas como oferenda e utilizadas para fazer fricções no corpo, ou na feitura de pós mágicos que serão esfregados nas incisões no corpo e rosto dos Àbíkú, e na confecção de amuletos (Onde) ou para banhos rituais.

Cada folha tem sua frase mágica, chamada Ofo, que aumenta seu poder de atuação no Ebo.
Cito aqui textualmente os Ofo escritos por Pierre Verger:
Ewé Abirikolo, insinu Òrun e pehinda.
Folhas de Abirikolo, coveiro do Céu, voltai
Ewé Agidimagbayin, Olorum maa ti kun, a a ku mo
Folha de Agidimagbayin, Olorun fecha a porta do Céu para que não morramos mais
Ewé Idi l'ori ki ona Òrun temi odi
Folha de Idi, dizei que o caminho do Céu está fechado para mim
Ewé Ija Agbonrin
Não ande pelo longo caminho que conduz ao Céu
Ewé Lara Pupa ni osun a won Àbíkú
A Folha de Lara Vermelha é o cânhamo dos Àbíkú
Olubotuje ma je ki mi bi Àbíkú omo
Olubotuje não me deixe parir filhos Àbíkú
Opa Emere ki pe ti fi ku, yio maa eu ni, nwon ni, nwon ba ri Opa Emere
Vara de Emere não os deixe morrer, isto lhes agrada, ver a Vara de Emere.

As crianças Àbíkú devem, no sétimo dia a partir do nascimento, se forem meninas, ou no nono dia, se forem meninos (se for o caso de gêmeos, o dia certo é o oitavo) passar pelo ritual de Ikomojade , quando recebem um nome específico que desestimule sua volta ao Òrun. Nesta cerimônia são usados água, dendê, sal, mel, obì, peixe, gin, atare.

NOMES ÀBÍKÚ
Omolabake - Esta é uma criança que eu mimarei.
Kujore - Deus poupou este aqui.
Siwoku - Pare de morrer. Tire as mãos da morte.
Kalejaye - Sente-se e goze a vida.
Omotunde - A criança voltou.
Maku - Não morra.
Kikelomo - Crianças são feitas para serem mimadas.
Moloko - Não tem mais enxada para enterrar.
Ayedun - A vida é doce.

Os nomes Àbíkú negam a morte e contam a doçura e a alegria da vida. Contam também como a Terra é bela e boa para se viver. Deve-se sempre chamar a criança por este nome, que pode ser incorporado oficialmente ou não aos seus outros nomes e sobrenomes. Isto também ajuda no rompimento do vínculo com o Egbe Òrun Àbíkú.

Como a descoberta do pacto é algo difícil, sempre próximo ao dia do aniversário da criança, até que esta complete 19 anos ou pelo prazo que o Ifá determinar, devem ser feitas oferendas nos locais sacralizados, acompanhadas ou não de Ebo a Egbe Eleriko.

Para Òrìsà Egbe se colocam, em uma grande cabaça, os seguintes elementos: Ovos; Akasa; Iyan; Akara; Eba; cana-de-açúcar; Obi; Éerù, Ekodide; Bananas; Àádun; Doces - em um número de 1 ou 6. Esta cabaça é fechada, colocada em um saco e solta num rio, com acompanhamento de rezas e cantigas,

REZA (DE IBADAN)
Egbe. a afável mãe, aquela que é apoio suficiente para aqueles que a cultuam.
Aquela que veste veludo, a elegante que come Cana-de-Açúcar na estrada de Oyo.
Aquela que gasta muito dinheiro em óleo de palma.
Aquela que está sempre fresca e tem fartura de óleo com o qual ela realiza maravilhas.
Aquela que tem dinheiro para o luxo, a linda.
Aquela que sucumbe à seu marido como à uma pesada clave de ferro.
Aquela que tem dinheiro para comprar quando as coisas estão caras [3].

CANTIGA (DE LALUPON)
Por favor, use um Oja.
O Oja é usado para atar as crianças em nossas costas.
Eu posso cultuá-la todo o quinto dia.
A Mãe Egbe que mora entre as plantas.
Dê-me meus próprios filhos.
Eu posso cultuá-la a cada cinco dias [3]
Os Àbíkú não são, como querem certos autores ou sacerdotes, seres maléficos, que tem por "missão" causar sofrimento às suas mães.
Eles carregam consigo, por causa de seu constante morrer/renascer, o peso de Iku, a morte, e são seres divididos entre a vontade de ficar na Terra com suas famílias e o desejo e a obrigação de retornar ao Egbe Òrun.

O Bàbálòrìsà ou Ìyálòrìsà, tenho verificado que uma criança é Àbíkú, deve estar preparado para contornar a natural reação dos familiares, de medo, susto, repulsa e mesmo horror, porque a primeira impressão de pais não habituados ao assunto, é crer que o sacerdote coloca seu filho em uma classificação espiritual de maldade e perversão. Também o risco iminente de uma morte súbita apavora a família que tende a reagir com agressividade ou incredulidade, e quer garantias infalíveis e imediatas que isso não é verdade, por quaisquer meios.

Portanto, é necessário que se explique aos pais o problema, e que se dê ao mesmo tempo soluções adequadas, que se cite casos e exemplos, naturalmente sem falar em nomes ou detalhes desnecessários, a fim de que os familiares concordem em ser totalmente esclarecidos e orientados para uma solução definitiva. Explicar também que oferendas "podem" reter o Àbíkú na Terra, se feitas corretamente, mas antes que tenha sido o pacto identificado e rompido, a oração e a crença profunda nos Òrìsà é de grande valia.

Mães que já tenham perdido filhos Àbíkú devem ser avisadas da necessidade de oferendas para que o Àbíkú não volte a nascer de seus corpos e elas possam dar à luz crianças normais.
Por vezes o nascer e morrer inúmeras vezes de uma criança pode abalar física e psiquicamente a Mãe e recursos médicos e terapêuticos "nunca" devem ser abandonados. Pelo contrário, sua utilização deve ser incentivada, em combinação com o tratamento espiritual.

Os pais não devem considerar isso com "castigo", "karma", "feitiço" ou outras explicações engendradas pela falta de conhecimento. Para isso o sacerdote deverá esclarecê-los e pacificá-los com a solidez e peso de seus argumentos.

Assim, no Brasil, como nos países Yorùbá, a problemática Àbíkú será contornada e menos pais serão vítimas de sofrimento causado pela morte de seus filhos.

*Ìyá Sandra Medeiros Epega preside há 35 anos o Ilé euiwyato/Guararema/ SP
Este trabalho pode ser copiado, divulgado, reproduzido, desde que na íntegra, e que sejam mantidas suas características religiosas e divulgada a fonte.

BIBLIOGRAFIA
[1] - Yorùbá religion & medicine in Ibadan, 1980, George E. Simpson, Ibadan University Press.

[2] - Afro-Asia NO. 14, 1983, A Sociedade Egbé orun dos Àbíkú, as crianças nascem para morrer várias vezes, Pierre Verger, pg. 138 a 160.

[3] - Yorùbá religion & medicine in Ibadan, 1980, George E. Simpson, Ibadan University Press.

[4] - Yorùbá religion & medicine in Ibadan, 1980, George E. Simpson, Ibadan University Press.

As outras informações foram obtidas através da tradição oral, com os anciãos da família Epega, em Ode Remo e Lagos.